sexta-feira, 11 de outubro de 2013

O DOM DA POESIA


Já falei aqui no Blog da amiga e parceira Claude Bloc. Vou falar de novo. 

E por que motivo?   Para mostrar a vocês o nosso terceiro trabalho, numa cantoria virtual.  São encontros poéticos que mantemos via internet, por email.  

Gosto muito desse desafio e cada vez que escolhemos um tema, ou um mote para desenvolver, sei que vem coisa boa da poeta do Cariri, que embora no nome e na filiação seja francesa, no nascimento e no coração é brasileira da gema, nordestina, cearense e caririzeira.

Dissertamos desta vez sobre a poesia, como Arte e como Dom.

Dom, sim, porque às vezes por mais que a pessoa tenha a técnica e a capacidade literária, falta-lhe a musicalidade, ou a rima fácil, o ritmo certo e a intimidade com os muitos modos de fazer poesia.  

Principalmente poesia dita "de cordel", com regras rígidas que não dão margem a frases soltas, a versos brancos e outras manobras literárias da poética dita moderna.

Na literatura de cordel, esse é o desafio.  Sem fugir ao tema, mantendo o estilo escolhido, versejar metrificando, rimando, dentro do ritmo próprio e da prosódia correta.

E quando isso acontece com uma parelha de cantadores, duelando com suas violas e violões, aí é que a coisa vira espetáculo.  

Aí é que vemos o valor da inteligência dos nossos repentistas sertanejos que muitas vezes aprenderam a ler em antigos folhetos de cordel já desgastados e amarelados pelo tempo, onde descobriam romances medievais, notícias históricas, enredos românticos ou políticos que vararam décadas e até hoje são lidos e relidos à luz de lampiões e candeeiros pelo Nordeste afora.

É desse dom que falamos.  Confiram e vejam se não temos razão!

Mote de Claude Bloc:
“A palavra pra mim é um brinquedo
Projetando as feições da alma humana.”

CB
Lamentei ter perdido a mocidade
Esse tempo de grande ilusão
Nos meus versos eu fiz a projeção
De viver alegria e liberdade
E se falo de amor, essa verdade
Eu já sei que é de mim que ele emana
Pois eu vivo a correr nessa gincana
Que deslizo no verso sem ter medo
A palavra pra mim é um brinquedo
Projetando as feições da alma humana.

FM 
Quando Deus fez o homem, Ele lhe deu
Ferramentas de grande utilidade
E os dons que ofertou à humanidade
São parcelas do Céu que prometeu
Transparências no véu que escondeu
Toda a Luz que da Sua face emana
É o Poder da bondade soberana
No princípio era o Verbo o Seu segredo
A palavra pra mim é um brinquedo
Projetando as feições da alma humana

CB
A Bondade de Deus é infinita
E entre os dons que nos deu, Eternidade
Vamos todos seguindo essa Verdade
Pois a alma da gente canta e grita
Sentimentos que a vida delimita
Mas de Luz nossa história se engalana
A Herdade Divina não engana
Nem relega o Homem ao degredo
A palavra pra mim é um brinquedo
Projetando as feições da alma humana

FM
Deus é bom, Deus é Pai, Sabedoria,  
E aos filhos protege e acalenta
Cada dia que passa, em mim cimenta
A Palavra que é carta de alforria
E a Verdade, mãe da Soberania
Derrotando o Mal que nos engana
Tem na voz a clareza espartana
Do Universo infinito e mete medo
A palavra pra mim é um brinquedo
Projetando as feições da alma humana

CB
Quando a vida parece não ter jeito
Quando o sonho se esconde no lamento
Vem de Deus nosso único alento
Que remove essa dor em nosso peito
E é d'Ele esse gesto tão perfeito
Que nos une e até mesmo nos irmana
Que nos livra dessa tristeza insana
Nos liberta e nos traça outro enredo
A palavra pra mim é um brinquedo
Projetando as feições da alma humana 

FM
Já louvamos a Deus, por necessário,
Pois é nossa primeira providência
E o fizemos com toda consciência
Pois de Deus é bem vindo este fadário
Para o homem não ser um perdulário
desses dons, é preciso qual chalana
Navegar manso rio de água plana
que da vida não esconde seu segredo
A palavra pra mim é um brinquedo
Projetando as feições da alma humana

CB
Pela terra deixei meu pensamento
Pelos ares a mais louca paixão
Descobri que o tempo é ilusão
E que a vida é também deslumbramento
Meu poema nasceu do movimento
E desliza do olhar pela pestana
E se esculpe com o fio da catana 
Pois o verso é mais breve que o levedo 
A palavra pra mim é um brinquedo
Projetando as feições da alma humana 

FM 
Da palavra o poeta é operário
No esforço pra construir seu verso
Extraindo a matéria do Universo
Seu motivo é cantar um canto vário
Sem ligar pr' o detalhe do salário
Tem seu gozo na estrofe que se explana,
E a  constrói feito molda a porcelana
Na alegria tão pura de um folguedo
A palavra pra mim é um brinquedo
Projetando as feições da alma humana

CB 
As palavras são contas de um rosário
Que rezamos com alma e sentimento
Pois revoam sem causar sofrimento
No rascunho do nosso dicionário
Não importa qual seja nosso erário
Se lidamos com a língua lusitana
Se moramos ao léu, numa choupana
Se pisamos em falso num lajedo
A palavra pra mim é um brinquedo
Projetando as feições da alma humana

FM
Já nem sei quando a minha Musa vem
Do Olimpo pra inspirar meu estro
sendo a vã sinfonia que eu orquestro
Eu me anulo no verso, eu sou Ninguém
E encaro essa vida com o desdém
De quem busca a razão que não profana 
ou que aceita a pobreza franciscana
com a ternura de quem perdeu o medo
A palavra pra mim é um brinquedo
Projetando as feições da alma humana

CB
Eu me inspiro no cheiro de uma rosa
No suspiro mais doce de uma flor
Nas procelas do mar, no trovador
Que deságua em verso sua prosa
Numa rima perfeita, tão cheirosa
Quanto um sonho de amor, feito nirvana
Delicado fervor, pureza lhana.
Ilustrando o sol com riso ledo 
A palavra pra mim é um brinquedo
Projetando as feições da alma humana 

FM
Toda a Glória é cantada em tom maior
Pra louvar tantos dons que recebemos
Construindo esse mundo que não vemos
mas sentimos vibrando em derredor
Sacrifícios aos pés do altar-mor
Desta vida que não mais nos engana
Um poema rimado não se empana
são quais uvas brilhantes num vinhedo
A palavra pra mim é um brinquedo
Projetando as feições da alma humana

 CB
O meu ritmo é sempre musical
Como um gesto de amor, em peito arfante
Como o som da viola mais vibrante
Que empolga e se cala no final
E conduz o poema em espiral
Como a brisa que sopra e se encana
E o som que do âmago emana
Provocando o mais íntimo arremedo
A palavra pra mim é um brinquedo
Projetando as feições da alma humana  

FM
Agradeço às Musas dadivosas
Ao meu lado, agindo docemente
Seu labor gracioso e inteligente
Inspirando-me com vozes tão sedosas
Seus cabelos em mechas olorosas
No dançar doce e lento da pavana
ao soar de uma flauta em meia-cana
A tal baile entreguei-me e ao seu enredo
A palavra pra mim é um brinquedo
Projetando as feições da alma humana.

4 comentários:

  1. Maravilha, Fred Monteiro, vocês são realmente maravilhosos cordelistas, A palavra pra mim é um brinquedo
    Projetando as feições da alma humana”,
    PARABÉNS

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  2. @migos Fred e Claude, vocês são almas-irmãs, com certeza!
    Nunca tinha visto tamanha sintonia poética entre dois versejadores, tão sensíveis, criativos e talentosos. A gente nem consegue distinguir quando começa ou termina, um e outro.
    Se misturarmos os versos, ninguém saberá dizer quem é quem..
    Longa vida a essa parceria de corações, mentes e almas!
    Grandes e afetuosos abraços,
    Ligia

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  3. Amigos Anônimo e Lígia: Obrigado pelos comentários. Realmente, mesmo sem nunca ter visto a Claude, pois nos conhecemos apenas pela Internet, existe sim, essa sintonia. E assim fica muito fácil a gente brincar com as palavras, construindo versos e nele pondo sentimento. Abraços!

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  4. Que maravilha, Fred! Que maravilha Claude!
    A palavra pra vocês é um brinquedo e que brinquedo! Projetando as feições da alma humana e que almas as suas! Parabéns, mais uma vez, pelo talento e pela sintonia dos versos.
    Um abraço de amor de minh'alma humana para vocês que me trazem a maior das saudades do Pátio de São Pedro, naqueles verdes anos 60/70... velhos tempos, belos dias...

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