quinta-feira, 24 de novembro de 2011

O RELÓGIO DO MEU BISAVÔ E O ARTESÃO DAS HORAS

The Ansonia Clock Co. - New York - 1870
Não cheguei a conhecer meu bisavô, o cidadão português Joaquim Monteiro da Cruz, que chegou ao Recife nos idos de 1860, e que comprou um Engenho de cana em Palmares, chamado Barra do Dia.   Meu avô Casimiro, nascido por volta de 1894, herdou a propriedade e lá nasceu meu pai Frederico, em 1917.

Tudo isso e o quanto mais aconteceu até hoje, foi assistido por um ancião, que agora conta quase 122 anos de idade.

Seu corpo é de mogno escuro, seu coração é de bronze polido como ouro. Seu cérebro são engrenagens precisas e sua garganta emite badaladas ritmadas de meia em meia hora.

Ouço a sua voz desde que me entendo por gente.

O Ansonia Queen Elizabeth
Ele tem nome e sobrenome:   É um “Ansonia Queen Elizabeth”.  Nasceu em 1890, na maior fábrica de relógios do mundo então conhecido, a Ansonia Clock Co. Veio de New York para o Recife de navio a vapor, naturalmente, como todos os seus irmãos gêmeos da mesma época. E daqui foi para o Engenho Barra do Dia, marcar o ritmo de vida dos meus ancestrais.

Um dia, início de setembro de 2003, seu coração parou, sua garganta/serpentina de aço calou.

Meu pai havia sofrido uma queda, o que lhe impediu de andar durante seis anos e meio, até sua morte aos 93 anos, em 2010.

Sem corda, o único alimento de que precisava, o relógio ficou longos 8 anos estático e mudo.

Até que, mês passado, resolvi que ele deveria voltar aos seus bons dias de confiável marcador do tempo.

Levei-o a um especialista. Waldecy, é o nome dele. Um artesão das horas. 

E hoje meus ouvidos se encantam quando o relógio bate novamente –solene como todo ancião- suas horas e meias-horas. Do mesmo jeito e com o mesmo som que embalou minhas noites de insônia, quando eu o ouvia, acordado, na minha cama de menino, depois rapaz e homem feito, no meio da noite ou da madrugada.

Meu amigo “Ansonia Queen Elizabeth” me foi confiado pela família. Tenho muito orgulho de ser seu guardião. E de certa forma, de guardar também as memórias de Bivô Joaquim, de Vovô Casimiro, do meu pai Frederico e de todos os irmãos.

Aqui, a entrevista com o Waldecy, que cuida de "pacientes" de todas as idades e origens. Louvado seja o Artesão das Horas que trouxe vida ao nosso relógio !