Eu e meu irmão Jaime gostávamos muito de jogar pif-paf, pôquer, dominó e gamão. Principalmente gamão. A gente passava tardes inteiras disputando uma partida atrás da outra.
Diziam que gamão é jogo de velho, mas a gente não tinha preconceito.
E haja botar os dados dentro dos copinhos e ploc-ploc-ploc, o dia inteiro; era o barulho dos copos de dados sendo batidos no tabuleiro de madeira, que a gente punha em cima dos joelhos, se estivesse sentado, ou no chão mesmo, que era o mais comum.
Esta dupla aprontou demais |
Muitas vezes entrávamos pela noite, em intermináveis partidas, em que apostávamos "gibis" velhos, coleções de rótulos de cigarros, livros de histórias de detetive; o que estivesse à mão, enfim.
Numa noite de sábado, a gente sem ter mesmo o que fazer, começou uma partida, disputada ardorosamente, dado a dado, jogada a jogada.
A noite avançava, entrando na madrugada e nada da gente terminar. Ploc, ploc, ploc, cantavam os dados... E o relógio marcando duas, três horas da manhã. E a gente nem pensando em entregar os pontos.
De repente, a voz forte de Paizinho avisa: -Parem com esse jogo imediatamente, ou eu desligo a luz da casa !
Obedecemos, por uns minutos, para dar tempo de Paizinho dormir novamente e, sorrateiramente, continuamos, jogando os dados com as mãos, em cima dos mosaicos do terraço. Mas, no entusiasmo, os dados cantavam mais alto.
Desligou o interruptor geral de energia da casa e a gente ficou no escuro total.
Mas só por algum tempo; da rua, vinha um resto de luz do poste, em frente à casa.
Não tivemos dúvida: pé ante pé saímos, abrindo o grande portão de ferro, com muito cuidado, e ganhamos a rua.
Debaixo do poste, o jogo de gamão continuou até o sol raiar e nos mandar de volta pra cama.
Não dou certeza, mas nessa manhã acho que dormi e sonhei com um monte de copinhos de dados batendo nos meus ouvidos: -ploc, ploc, ploc, ploc...
(do livro "Caçador de Lagartixas" - Ed Livro Rápido, Recife, 2008)
(do livro "Caçador de Lagartixas" - Ed Livro Rápido, Recife, 2008)