quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

GAMÃO NA MADRUGADA



Eu e meu irmão Jaime gostávamos muito de jogar pif-paf, pôquer, dominó e gamão. Principalmente gamão. A gente passava tardes inteiras disputando uma partida atrás da outra.
Diziam que gamão é jogo de velho, mas a gente não tinha preconceito. 
E haja botar os dados dentro dos copinhos e ploc-ploc-ploc, o dia inteiro;  era o barulho dos copos de dados sendo batidos no tabuleiro de madeira, que a gente punha em cima dos joelhos, se estivesse sentado, ou no chão mesmo, que era o mais comum.

Esta dupla aprontou demais
Muitas vezes entrávamos pela noite, em intermináveis partidas, em que apostávamos "gibis" velhos, coleções de rótulos de cigarros, livros de histórias de detetive; o que estivesse à mão, enfim.

Numa noite de sábado, a gente sem ter mesmo o que fazer, começou uma partida, disputada ardorosamente, dado a dado, jogada a jogada.

A noite avançava, entrando na madrugada e nada da gente terminar. Ploc, ploc, ploc, cantavam os dados... E o relógio marcando duas, três horas da manhã.  E a gente nem pensando em entregar os pontos.

De repente, a voz forte de Paizinho avisa: -Parem com esse jogo imediatamente, ou eu desligo a luz da casa !

Obedecemos, por uns minutos, para dar tempo de Paizinho dormir novamente e, sorrateiramente, continuamos, jogando os dados com as mãos, em cima dos mosaicos do terraço.  Mas, no entusiasmo, os dados cantavam mais alto.

Paizinho, que não havia voltado a dormir, não disse mais nada. 

Desligou o interruptor geral de energia da casa e a gente ficou no escuro total.

Mas só por algum tempo; da rua, vinha um resto de luz do poste, em frente à casa.

Não tivemos dúvida: pé ante pé saímos, abrindo o grande portão de ferro, com muito cuidado, e ganhamos a rua.

Debaixo do poste, o jogo de gamão continuou até o sol raiar e nos mandar de volta pra cama.

Não dou certeza, mas nessa manhã acho que dormi e sonhei com um monte de copinhos de dados batendo nos meus ouvidos: -ploc, ploc, ploc, ploc...


(do livro "Caçador de Lagartixas" - Ed Livro Rápido, Recife, 2008)

8 comentários:

  1. Como é bom ter momentos assim para recordar !
    Beleza !
    Gostei muito.
    abçs
    Myrinha

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. É bom demais Myrinha. Diz o ditado que recordar é viver, né? Então eu devo estar com uns 385 anos, porque minha vida corre em paralelo com essas recordações. Abração!

      Excluir
  2. Joguei muito gamão com Mario de Ia nos bancos da casa deles em Olinda, era tudo de bom!
    Hoje jogo gamão no computador a emoção não é a mesma mas ganhar é sempre ganhar e de um bichinho inteligente como o PC também tem seu valor!
    Tempos modernos, fazer o que?
    Dulce

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Ah ... as rodadas de dominó na casa de Maroca, que duravam o fim de semana inteiro, hehehe.. Mas a tradição continua lá na tua casa e de Miro.

      Excluir
  3. Adoro estes retalhos de lembranças que vão pintando na memória e de retalho em retalho vamos montando o jogo da nossa vida.
    Parabéns meu caro Fred.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Dalinha, depois que a gente fica mais velho tem mesmo é que curtir o que viveu, fazer um balanço da vida, retirar da conta qualquer prejuízo, supervalorizar os lucros, botar no bolso os dividendos e gozar do merecido prazer sem medo de ser feliz !

      Excluir
  4. Oi Fred,
    Estou postando novas fotos, e de repente, este material antigo sumiu das feiras de antiguidades de São Paulo, sempre foi um material cobiçado aqui, e temos muitos colecionadores,um exemplo é os Boliches de Madeira todos que via comprava para modelos, para uma futura reedição por minha parte,quem tem uma caixa destas da infância NÃO vende, eu tenho 3 modelos diferentes,um e nacional, e era do caminhão de bombeiro da estrela, e outros dois foram comprados no Uruguai, lá tinha muita influencia européia,muitos caminhões meus são do Uruguai, quanto ao Pião Sonoro,e mesma situação.Acredito que eram fabriquetas, além da Metalma e Estrela, não tenho nenhum no momento, eles amassavam e iam para o Lixo, alem disso na nossa infância, era comum o brinquedo sumir com a adolescência, achavam que íamos ser infantis,eram doados. Eu tive um urso de infância que o fim foi esse.Mais consegui comprar um parecido fazem, comprei em 1988 lá na feira da Praça 15, no Rio de Janeiro.
    Abraços Egon!

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Grande Egon! Vc realmente é um apaixonado pelos brinquedos. Eu lamento também não ter mais nada que me lembre fisicamente os brinquedos de infância. Tudo o que tenho são retratos deles na memória. Até as cores vivas ficaram marcadas, mas perdi a noção de como eram, que peso e que cheiro tinham, suas marcas de uso, acidentes, amassões, etc. Admiro muito sua iniciativa de manter essa memória física que vc tem com seus caminhões e brinquedos. É fascinante, mesmo ! Parabéns e continue. Isso é História !

      Excluir